sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

mônadas Definição:Leibniz


mônadas
Definição:Leibniz

Com isto, com o infinitamente pequeno do cálculo infinitesimal, com a força viva como elemento definitório da matéria em lugar da pura extensão, temos os dois elementos, as duas ideias fundamentais que, chegando a uma maridagem, a um casamento, a uma união perfeita, vão produzir a metafísica propriamente dita de Leibniz. A metafísica de Leibniz está constituída toda ela sobre o fundamento da ideia de "mônada". Pode-se dizer que a metafísica, de Leibniz é a teoria das mônadas, e ele o compreendeu assim, visto que sua última obra, publicada depois de sua morte, leva este nome: "Teoria das Mônadas", ou dito em uma só palavra: Monadologia. Vamos ver que é a mônada.

A palavra "mônada" não é de Leibniz. Provavelmente Leibniz tomou-a de suas leituras de um filósofo da Renascença, üm físico, astrônomo e matemático muito genial, porém um pouco fantástico que se chamava Giordano Bruno. Giordano Bruno foi quem a pôs em circulação na Europa. Talvez ele a tivesse tomado também de leituras que houvesse feito, de místicos e filósofos da Antiguidade; talvez de Plotino, que também a empregou. O fato é que até muito tarde na sua evolução pessoal filosófica não usou Leibniz a palavra "mônada", e quando chega já a usá-la cristalizam-se em torno dessa palavra todos os elementos fundamentais de sua metafísica.

Que é a mônada? A mônada é primeiramente substância, quer dizer, realidade. Substância como realidade, e não substância como conteúdo do pensamento, como termo puramente psicológico de nossas vivências, mas substância como realidade em si e por si. Pois bem; que é para Leibniz ser substância? Ser substância, para Leibniz, não consiste em ser extenso. Acabamos de vê-lo. Para Leibniz, a extensão é a ordem das substâncias, a ordem da simultaneidade das substâncias, como o tempo é a ordem da sucessão de nossos estados de consciência. A extensão, o espaço é uma ideia prévia, mas não tem um objeto substancial, real. O único objeto substancial, real, a substância, a mônada, não pode, por conseguinte, definir-se pela extensão. Se a mônada pudesse definir-se pela extensão, então a mônada seria extensa. Que quer dizer? Que seria divisível; e se fosse divisível seria dual, ou trial etc. Mas a mônada é mônada, ou seja, única, só, e, por conseguinte, indivisível. E para que seja indivisível não vale falar de átomos. Os átomos materiais não satisfazem a Leibniz, porque o átomo, se é material, se é extenso, é divisível; será mais ou menos difícil de dividir pela técnica digital humana, mas como não se trata de técnica digital, mas da estrutura de si e por si da substância, uma substância extensa será sempre divisível. Por conseguinte, a mônada não pode ser divisível; é indivisível, e se é indivisível, não é material, não pode ser material. E se, sendo indivisível, é imaterial, que é, pois? Qual é a consistência da mônada? Em que consiste a mônada? Se não consiste em extensão, se não consiste em matéria, em que consiste? Pois não pode consistir em outra coisa que em força, em energia, em vis, como se diz em latim; em vigor. A mônada é, pois, aquilo que tem força, aquilo que tem energia.

Mas que é força e energia? Força e energia não as devemos representar como aparecem na nossa experiência sensível. Na nossa experiência sensível chamamos força à capacidade que um corpo tem de pôr em movimento outro corpo. Define-se, pois, a força pela capacidade de pôr em movimento outro corpo. Mas assim não pode definir-se metafisicamente a energia, porque aqui não há corpos; as mônadas não são corpos, as mônadas não são extensas. Então, que será esta força em que consiste a mônada? Não pode ser outra coisa que a capacidade de agir, a capacidade de atuar. E que é este atuar? Que é este agir? Pois verificamos que não há para nós intuição de ação, intuição dinâmica nenhuma, senão a que temos de nós mesmos. Aqui outra vez o método do cogito cartesiano vem dar a Leibniz um apoio e um auxílio. Pois como podemos imaginar e representar a força, a energia da mônada? Pois do mesmo modo que nós, no interior de nós mesmos, captamos a nós mesmos como força, como energia; quer dizer, como trânsito e movimento interno psicológico de uma ideia, de uma percepção a outra percepção, de uma vivência a outra vivência. Essa capacidade de ter vivência, essa capacidade de variar nosso estado interior, que deixa de ser a vivência A para passar a ser a vivência B, depois a vivência C; essa capacidade íntima de suceder-se umas a outras as vivências, é isso que constitui para Leibniz a consistência da mônada. A mônada é substância ativa. Que quer dizer isto? Substância, diremos, psíquica. Essa substância ativa, essa capacidade de passar por vários estados, essa possibilidade de_ viver com que se pode definir a mônada, tem uma porção de caracteres interessantes.

Em primeiro lugar, a mônada não somente é indivisível, mas individual. Que quer dizer isto? Quer dizer que uma mônada é totalmente diferente de outra mônada; não pode haver no universo duas mônadas iguais. Em virtude do princípio de Leibniz chamado dos "indiscerníveis", se uma mônada fosse igual a outra mônada, verdadeiramente igual a ela, não poderiam ser duas, mas uma. As coisas no mundo, as realidades no mundo são indiscerníveis quando são iguais. Portanto, nunca são iguais. A individualidade da mônada é um dos pontos essenciais da metafísica de Leibniz.

Mas, ademais, essa individualidade é simplicidade. Indivisível significa indivíduo, mas ademais simples. Simples quer dizer sem partes. A mônada não tem partes, mas, como é ativa, há de se encontrar uma definição que torne compatível a individualidade, a indivisibilidade, a simplicidade da mônada com as mudanças interiores da mônada. Como pode haver mudanças interiores, atividade, mudança interior nos estados da mônada se, de outro lado, tem que ser indivisível, individual e simples? Pois não há mais que uma maneira que é dotar a mônada de percepção.

A mônada está, pois, dotada de percepção e de apetição, caracteres de tudo o que é essencialmente psíquico. Percepção, porque a percepção é justamente o ato mesmo de ter o múltiplo no simples. Na alma espiritual, no ato da percepção, o múltiplo percebido, o conteúdo múltiplo da vivência está na unidade indivisível, na unidade simples daquele que percebe. Na percepção é que se dá precisamente o requisito que antes exigíamos, a saber, que a mônada seja simples, indivisível e individual, e ao mesmo tempo que contenha uma pluralidade de estados. Essa precisamente é a percepção; e assim define literalmente Leibniz a percepção: como a representação do múltiplo no simples.

Mas, além de percepção, a mônada tem apetição, ou seja, tendência de passar de uma a outra percepção. As percepções se sucedem na mônada, e esse suceder-se das percepções na mônada constituem a apetição. Agora já temos uma representação, uma ideia muito mais complexa e clara da atividade da mônada. A atividade da mônada é dupla: de um lado, perceber; de outro lado, apetecer. Corresponde, pois, — como diz o próprio Leibniz — a realidade metafísica da mônada a essa realidade que chamamos o "eu".

Paremos agora um momento; relembremos o geometrismo e o mecanismo de Descartes. Que vemos agora? Vemos que Leibniz perfurou, por assim dizer, o fenômeno, a aparência do geométrico, do mecânico, do físico, do material, e por debaixo dessa aparência fenomênica do extenso, do mecânico, do material, do físico, descobriu, como suporte real metafísico dessa aparência mecânica, a mônada, que não é extensa, que não é movimento, mas sim é pura atividade, ou seja, percepção e apetição.

Estas mônadas são a sucessão constante de diferentes e diversas percepções, o trânsito constante de uma a outra percepção. E qual é a lei íntima desse trânsito? É uma lei espontânea. Assim como o círculo percorrido por um ponto está já in nuce, em germe, dentro da divisão infinitesimal do ponto, assim também as mônadas, para Leibniz, não têm janelas nem nelas penetra nada do mundo exterior. Mas a lei íntima de sucessão de seus estados perceptivos e de sua própria apetição é uma lei que rege essa sucessão; da mesma forma que a lei íntima de uma função, de uma variável, está integralmente contida no seio do ponto dessa variável. E assim verificamos que em qualquer momento de sua vida, do seu ser, do seu existir; em qualquer instante da sua realidade, a mônada é uma redução do mundo inteiro. É a mônada em qualquer momento de sua vida algo que nesse momento contém todo o passado da mônada e todo o porvir, visto que a série das percepções que a mônada vai tendo vem determinada por uma lei interna, que é a definição dessa individualidade metafísica substancial. Em qualquer momento da vida da mônada todo o seu passado está vertido nesse presente e esse presente por seu turno não é mais do que o prelúdio do futuro, inscrito já também na atividade presente da mônada. Pois bem; se as mônadas refletem desta sorte o universo; se cada mônada é um reflexo universal, é assim exclusivamente de um certo ponto de vista. Reflete, pois, cada mônada a totalidade do universo, porém a reflete do ponto de vista em que se encontra situada, e ademais a reflete obscuramente. Leibniz distingue perfeitamente a percepção da apercepção. Leibniz distingue entre perceber e aperceber. Que é aperceber? Muito simplesmente: aperceber é ter consciência de que se está percebendo. A apercepção é o saber da percepção; a percepção que se sabe a si mesma como tal percepção. De modo que Leibniz distingue entre estes atos psíquicos: a apercepção e a percepção. [Morente]

Responsáveis
João Cardoso de Castro
Filósofo e Mestre em Educação, UFRJ
Murilo Cardoso de Castro
Doutor em Filosofia, UFRJ
http://www.filoinfo.bem-vindo.net/filosofia/modules/lexico/entry.php?entryID=4739

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LEIBNIZ E SUA CONCEPÇÃO DO MELHOR DOS MUNDOS
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Rogério VAGNA
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RESUMO:
    



Trata-se, neste artigo, de examinar em que consiste o otimismo leibniziano, que garante ter Deus escolhido este como o melhor dos mundos, entre todos os possíveis que se apresentaram a Ele.
Concebendo haver um número infinito de substâncias simples, das quais são formados os compostos, Leibniz defende estarem elas unidas numa harmonia já preestabelecida pelo Criador.
Utilizando-se de leis simples e universais para criar, Deus conseguiria atingir a maior diversidade de fenômenos, e, portanto, a máxima perfeição no mundo.

PALAVRAS-CHAVE:
Mônada; multiplicidade na unidade;
Harmonia preestabelecida; otimismo.
  

Para que possamos entender o otimismo leibniziano, que garante ser este o “melhor dos mundos possíveis”, é preciso, antes de mais nada, compreender como se configura esta harmonia preestabelecida, da qual, segundo Leibniz, Deus teria dotado o mundo no momento da criação. A harmonia preestabelecida que se expressa nas várias percepções e na mútua dependência das mônadas seria alcançada porque Deus teria como critério objetivo de perfeição a íntima relação existente entre a diversidade e a simplicidade, isto é, entre o múltiplo e o uno. Convém, no entanto, verificar o que Leibniz entende por mônada, visto ser entre elas que se estabelece tal harmonia.
 Caracterizando as mônadas como substâncias unas e indivisíveis é que Leibniz começa sua Monadologia. Como substâncias simples, ou seja, sem partes, as mônadas não podem apresentar extensão nem figura possíveis, sendo consideradas como os “verdadeiros Átomos da Natureza, e, em uma palavra, os Elementos das coisas”, tornando-se os compostos nada mais do que um agregado de mônadas.
 Não sendo as mônadas substâncias materiais, elas devem ser entendidas como uma “força” em constante atividade. Ingênitas e imperecíveis; criadas por Deus, só se extinguem por aniquilamento, por não participarem do processo de geração e corrupção a que estão
sujeitos todos os compostos naturais, os quais acabam em partes. Também nenhuma de suas mudanças internas pode ser excitada, aumentada ou diminuída por outras criaturas, já que “as Monadas não têm janelas por onde qualquer coisa possa entrar ou ir”(LEIBNIZ,
1983a, p.105). Não recebendo as mônadas influência externa, faz-se necessário que haja um princípio de mudança interno, que comporte a “multiplicidade na unidade”(LEIBNIZ, 1983a, p.106), garantindo a pluralidade de afecções que elas devem ter. Cada estado passadouro representado por essa multiplicidade na unidade denomina-se percepção. As percepções de cada uma das mônadas se acomodam perfeitamente às das outras, de modo que toda substância é como um mundo completo e como um espelho de Deus, ou melhor, de todo o universo, expresso por cada uma à sua maneira, pouco mais ou
menos como uma mesma cidade é representada diversamente conforme as diferentes situações daquele que a olha (LEIBNIZ, 1983b, p.125). Essa pluralidade de percepções que as mônadas compreendem na sua unidade pode ser pensada analogamente com a atividade da nossa mente. Apesar de a mente ser una, seu conteúdo é múltiplo e modifica-se a cada novo pensamento. Apetição chama-se à tendência
que cada mônada possui internamente de mudar suas percepções, chegando sempre a um estado novo de representação.
Dessa forma, temos assinalada a existência de uma hierarquia de mônadas e, segundo Leibniz, não perceber isso foi o erro dos cartesianos. Se as mônadas representam o universo sob seus respectivos pontos de vista, e distinguem-se umas das outras pelas
qualidades que lhes foram atribuídas por Deus no momento de sua criação, haja vista não ser possível encontrar-se na natureza dois seres exatamente idênticos, essa classificação se dá pelo grau de perfeição de suas percepções, sendo tão-só representações ora mais claras, ora mais confusas de um mesmo todo. Daí Leibniz designar mônadas ou enteléquias as substâncias simples, detentoras apenas de percepção, e denominar almas irracionais todas aquelas que possuem uma percepção mais clara e acompanhada de memória, a qual proporciona às almas uma certa consecução que imita a razão. Eis o que possibilita aos cachorros, por exemplo, lembrar-se de uma dor sentida em percepção anterior, somente pelo fato de verem o pau que lhes proporcionou tal aflição. Já os homens possuiriam o que
se chama de Alma racional ou Espírito, pois são capazes de conhecer as verdades eternas, chegando à ciência de si mesmos. Assim, afirma Leibniz, “pensando em nós, pensamos no Ser, na Substância, no simples e no composto, no imaterial e até mesmo em Deus,
concebendo como sem limites nele aquilo que em nós é limitado”(LEIBNIZ, 1983a, p.108).
Esta última possui não somente simples percepções, mas as percepções, que seriam percepções dotadas de consciência.
 No “Prefácio” dos Novos Ensaios, nosso autor se utiliza do exemplo do bramido do mar, ouvido quando estamos na praia, para mostrar possuirmos pequenas percepções desprovidas de consciência, que somos incapazes de distinguir no conjunto de todas. 
Para ouvir este ruído como se costuma fazer, é necessário que ouçamos as partes que compõem este todo, isto é, os ruídos de cada onda, embora cada um desses pequenos ruídos só se faça ouvir no conjunto de todos os outros conjugados, isto é, no próprio bramir, que não se ouviria se esta onda que o produz estivesse sozinha (LEIBNIZ, 1988b, p.08).
Concebendo haver um número infinito de mônadas, “fontes de suas ações internas e, por assim dizer, Autômatos incorpóreos”(LEIBNIZ, 1983a, p.106), Leibniz elimina a dualidade entre res cogitans e res extensa. As mônadas representam tanto substância quanto matéria. Todavia, é preciso explicar como elas, que não influenciam umas às outras, podem se relacionar. Uma sincronia existente entre as mônadas, da mesma maneira como dois relógios que marquem sempre a mesma hora, pode ser concebida de três formas: 1) construindo-as de tal modo que exerçam influência uma sobre a outra; 2) encarregando seu Artífice de as ajustar continuamente; 3) construindo-as de maneira tão perfeita que atuem em sincronia
desde sua criação. Do que já foi dito, sabe-se que a primeira hipótese não pode ser aceita, pois uma mônada não pode exercer influência sobre a ação de outra. Quanto ao Artífice ajustar continuamente suas criaturas, parece contrário à sabedoria divina ter de reajustar sua obra de quando em quando; o mecanismo criado por Deus seria tão imperfeito quanto qualquer relógio produzido por um simples artesão. Com tanto não se nega que Deus mantém continuamente o conjunto de sua obra, mas apenas se diz que Ele não teria de intervir
extraordinariamente no mundo. Embora até mesmo os milagres (entendidos pelas criaturas como ações extraordinárias) estejam em conformidade com a ordem geral. As leis naturais ou “máximas subalternas” devem ser entendidas como um “costume de Deus, do qual pode dispensar-se, por causa de uma razão mais forte do que a que o moveu a servir-se destas máximas”(LEIBNIZ, 1983b, p.123). A terceira hipótese é garantida pela ideia de um movimento perfeito, assim “a mesma força e vigor subsiste sempre, passando somente de
matéria em matéria, conforme as leis da natureza e a bela ordem
pré-estabelecida”(LEIBNIZ, 1988a, p.235).
Na segunda carta de sua Correspondência com Clarke Leibniz mostra como entende a relação de Deus com as criaturas. 
Não digo que o mundo corporal é uma máquina ou um relógio que anda sem a intervenção de Deus, e professo absolutamente que as criaturas têm necessidade de sua influência contínua; mas sustento que se trata de um relógio que anda sem ter necessidade de ser regulado, porque senão se deveria dizer que Deus volta atrás. Deus previu tudo e cuidou de tudo de antemão. Em suas obras há uma
harmonia, uma beleza já preestabelecida (1988a, p.239).
Sendo assim, cada uma das mônadas atua como se não houvesse outra. Entretanto, as ações de todas fazem parecer que se influenciam mutuamente. Dito isso, vêem-se as razões a priori para as coisas não poderem suceder de outro modo.
Porque Deus, ao regular o todo, atendeu a cada parte e muito em especial a cada Mônada, cuja natureza representativa nada conseguiria limitar à representação de uma só parte das coisas, muito embora, na verdade, esta representação seja confusa apenas nos pormenores de todo o universo, e distinta apenas em pequena
parte das coisas, isto é, ou nas mais próximas ou nas maiores, relativamente a cada uma das Mônadas; de outro modo cada Mônada seria uma Divindade (LEIBNIZ, 1983a, p.111).
 Atentando-se para o que Leibniz chamou de Lei de continuidade, na qual afirma a natureza nunca dar saltos, que tudo “se passa sempre do pequeno ao grande, e vice-versa, através do médio, tanto nos graus como nas partes, e que jamais um movimento nasce imediatamente do repouso nem se reduz, a não ser por um motivo menor”(LEIBNIZ, 1988b, p.10), pode-se dizer que o presente não seria senão a continuação de um estado anterior, e que “também o presente está prenhe do futuro”(LEIBNIZ, 1983a, p.107).
Sobre as leis simples e universais O melhor dos mundos possíveis é aquele que apresenta um maior intercâmbio eficiente entre os dois fatores determinantes da perfeição, isto é, entre o uno e o múltiplo.
Resta-nos então compreender como se relacionam unidade e multiplicidade, ou seja, como se consegue o mundo mais diverso estando ele submetido, pela necessidade, à simplicidade.
Leibniz resolve tal problema dizendo: No que se refere à simplicidade das vias de Deus, esta realiza-se propriamente em relação aos meios, como pelo contrário, a variedade, riqueza ou abundância se
realizam relativamente aos fins ou efeitos. E ambas as coisas devem equilibrar-se, como os gastos destinados a uma construção com o tamanho e a beleza nela requeridos (LEIBNIZ, 1983b, p.122).
 Ao criar o mundo Deus escolheu aquele que é o mais perfeito, ou seja, o que é ao mesmo tempo mais simples em suas leis e mais diverso em seus fenômenos. Há então, com a ideia de unidade na multiplicidade, uma identidade entre perfeição e harmonia, a ponto de tornarem-se uma só coisa. A harmonia é entendida como um consenso na pluralidade, é ainda uma ordem, uma regularidade. No Discurso de Metafísica, Leibniz diz não ser possível imaginar no mundo eventos que não evidenciam alguma uniformidade, por mais complexos que eles possam ser (1983b, p.123).
 Leibniz acreditava que o melhor dos mundos deve apresentar uma maior diversidade e assim possuir o maior número possível de indivíduos. Daí ele não aceitar a existência do vácuo, pois no Universo “quanto mais matéria existir, mais Deus terá ocasião de exercer sua sabedoria e seu poder” (LEIBNIZ, 1988a, p.238).
O uno e o múltiplo estão reunidos em uma harmonia já preestabelecida, de modo que as ações de Deus estariam em conformidade com as leis mais gerais.
Assim, aquilo que é tido por extraordinário, o é apenas relativamente a alguma ordem particular estabelecida entre as criaturas, pois quanto à ordem universal tudo nela está conforme. É tão verdadeiro isto que, não só nada acontece no mundo que seja absolutamente irregular, mas nem sequer tal se poderia forjar, [visto que]... se alguém traçar, duma só vez, uma linha ora reta, ora circular, ora
de qualquer outra natureza, é possível encontrar noção, regra ou equação comum a todos os pontos desta linha, mercê da qual essas mesmas mudanças devem acontecer. Não existe, por exemplo, rosto algum cujo contorno não faça parte duma linha geométrica e não possa desenhar-se dum só traço por certo movimento regulado (LEIBNIZ, 1983b, p.123).
 Temos então que a lei da simplicidade é a mais eficaz, aquela capaz de produzir o máximo de bens, requerendo o mínimo de esforços; e isso, acredita Leibniz, arranjaria o melhor dos mundos possíveis. Dizer que leis mais simples são a condição para a multiplicidade das coisas existentes não garante serem poucas as leis que geram a
diversidade, mas apenas que são as mais simples que o fazem. Não se nega que o melhor mundo ainda possua uma infinidade de leis naturais. Considerar uma lei como a mais simples quer dizer também que ela se aproxima mais da perfeita universalidade, que está
livre de exceções. Pois as exceções se dão quando duas leis se mostram conflitantes e uma restringe a outra; agora, se as exceções tornam as leis mais complexas, a maior simplicidade deverá exigir, então, leis singulares e universais. Leis que guardem exceções seriam mperfeitas e, portanto, contrárias à sabedoria divina. Daí o melhor dos mundos
envolver um conjunto de princípios universais e perfeitos e não um sistema de leis conflitantes, na qual uma maior regularidade compensaria as falhas de uma menor. A universalidade é sinal de regularidade; uma multidão de leis universais é que será capaz de
produzir uma enorme pluralidade de efeitos. 
 Há uma infinidade de mundos possíveis no entendimento divino e não se pode dizer que sua escolha tenha sido arbitrária ou apenas amparada por sua vontade. Deus possui a Potência, da qual tudo se origina, também o Conhecimento da particularidade das idéias e
finalmente a Vontade, que age de acordo com o princípio do melhor. Se em Deus esses atributos não encerram quaisquer limites, nas mônadas criadas se encontram proporcionalmente ao grau de perfeição que possuem. “Diz-se que a criatura atua exteriormente, na medida em que tem perfeição; e padece a atuação de uma outra, na
medida em que é imperfeita. Assim, se a Mônada tiver percepções distintas, atribui-se-lhe a ação; se confusas, a paixão.”(LEIBNIZ, 1983a, p.110) O que não poderia ser diferente, pois se Deus as criasse completamente ativas e perfeitas, as mônadas se igualariam a Ele, e
isso, nos levaria a uma remissão ao infinito. Seria preciso buscar externamente um outro ser que fosse a causa desses seres perfeitos, mas que não fosse produto de nenhum outro. 
 Diante da noção de harmonia preestabelecida, na qual tudo já existe potencialmente nas mônadas no momento de sua criação por Deus, pergunta-se a respeito de estar o Supremo artífice também obrigado a escolher sempre o melhor. A isso Leibniz responderá não se tratar de uma necessidade lógica, na qual o oposto implique contradição, mas sim de uma necessidade moral de se produzir o máximo de bens, assegurando ainda a contingência de uma alternativa distinta. Esse “não poder” agir de outra maneira coloca-se a Deus da mesma forma como se mostra impossível a um sábio matemático aceitar um resultado errôneo para uma certa equação, o fato de Deus ter de escolher o melhor dos mundos nãoser de modo algum condenável, visto demonstrar apenas o poder de um Ser que é sapientíssimo.
 Então, diante dos vários universos possíveis, a razão suficiente para a escolha divina deve “encontrar-se na conveniência ou nos graus de perfeição contidos nesses mundos [...] eis a causa da existência do melhor, conhecido por Deus pela sabedoria, escolhido pela sua
bondade, e produzido pela sua potência”(LEIBNIZ, 1983a, p.110).
Considerações Finais É na sua metafísica monadologica que encontramos os fundamentos daquilo que levará Leibniz a uma concepção otimista do mundo, defendendo ser este o melhor entre
todos os possíveis.
 Sendo as mônadas consideradas sem partes, e, por isso, os elementos das coisas, e ainda todo o composto como por elas formado, apresenta-se a noção de uma harmonia preestabelecida por Deus para assegurar a unidade de cada uma das mônadas quando se
encontram agregadas, formando a multiplicidade.
 São exatamente esses dois fatores, a saber, o uno e o múltiplo, que, concatenados harmoniosamente, garantirão toda a perfeição no mundo. Toda a quantidade de essência presente na mônada criada iguala-se ao seu grau de perfeição, do mesmo modo que sua
perfeição corresponde ao seu grau de distinção, e, por fim, tem a mônada ação à medida que se distingue. Com isso temos assinalada a relação entre ação e distinção, que por sua vez une-se às de perfeição e harmonia.
 Deus comparando duas substâncias simples encontra a razão para acomodá-las de tal forma que, quando uma produzir certa ação, a outra sofrerá uma paixão proporcional. O que determina se uma mônada representa um estado ativo ou passivo são os graus de
distinção que ela comporta naquele dado momento.
Se por um lado Deus se utiliza do critério de simplicidade para criar o melhor mundo, pelo fato de que leis mais simples são também as mais eficientes, por outro todas as suas ações estão conformes à mais perfeita universalidade. De modo que não se pode dizer que há no mundo qualquer irregularidade e imperfeição, nem tampouco que Deus permitiu o mal, como o queriam os opositores do sistema leibniziano.
 É com grande otimismo que Leibniz responde a esse problema. O mal se expressaria de três formas, a saber: o mal metafísico, o mal moral e o mal físico. O primeiro surge da imperfeição da essência das criaturas, visto ser a perfeição apenas atributo divino.
Isso não quer dizer que Deus tenha agido imperfeitamente ao criar, mas apenas que permitiu o menos perfeito. Quanto ao mal moral, pode-se dizer que deriva do metafísico.
Somente um ser perfeito poderia agir sem incorrer no erro, mas sendo as criaturas seres limitados em sua essência, não são capazes de compreender o todo, e, logo, o equivocarem-se.                                                                               Com tanto não se deve responsabilizar o Criador, pois a causa desse mal é unicamente a criatura. O mal físico seria consequência da limitação metafísica e também uma punição pelo pecado. Se Deus permite determinado sofrimento, só o faz tendo em vista um bem
ainda maior que possa surgir. A dor faz com que se aprecie melhor o bem, pois ela contribui para a perfeição daquele que a sofre.
Contudo, ao Supremo Artífice que compreende presente, passado e futuro em um só momento, tudo está de acordo com a mais bela harmonia preestabelecida.

Graduando do curso de Filosofia, 3° ano da Faculdade de Filosofia e Ciências – UNESP – CEP 17525-900– 
Marília, São Paulo – Brasil, e-mail: rvagna@yahoo.com.br e membro do grupo de pesquisa “Em torno do iluminismo”, com orientação do Dr. Ubirajara Rancan de Azevedo Marques e-mail: (bira@marilia.unesp.br)

Referências:
LEIBNIZ, G. W. Correspondência com Clarke. Tradução Carlos Lopes de Mattos. São Paulo: Nova Cultural, 1988a. (Os pensadores).
Novos ensaios sobre o entendimento humano. Tradução: Luiz João Baraúna. São Paulo: Nova Cultural, 1988b. (Os pensadores).
Os princípios da filosofia ditos a monadologia. Tradução Marilena de Souza Chauí. São Paulo: Abril Cultural, 1983a. p.103-15. (Os pensadores). Discurso de Metafísica. Tradução Marilena de Souza Chauí. São Paulo: Abril Cultural, 1983b. p.117-52. (Os pensadores).
ARTIGO RECEBIDO EM:

http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/ric/article/viewFile/146/137
 KETHER (Pai – Mônada)
Para ser consciente de Si Mesmo, ou para fazer-se compreensível a Si Mesmo, Ain se converte em pws y)Ain Soph (Infinidade) e todavia mais em rw) pws y) Ain Soph Aour, a Luz Absoluta Ilimitada dos budistas); que então por contradição (Tsimtsum, de acordo com o Zohar) se concretizou em um Ponto Central Sem Dimensões, Kether, a Coroa, que é a primeira sephirah da Árvore da Vida.
Outra forma de expressar esta mesma ideia é através do conceito de negatividade absoluta, as Forças Giratórias (Rashith haGilgolin) que pressagiam a primeira manifestação do Ponto Primordial (Nekudah Rishonah), que se converte na raiz primitiva da qual surgirá tudo mais. Kether é a Mônada inescrutável, a raiz de todas as coisas, definida por Leibniz em relação à natureza extrema das coisas físicas e a unidade última de consciência, como um ponto metafísico, um centro de energia espiritual, não ampliável e indivisível, cheio de vida incessante, de atividade e força. É o protótipo do todo espiritual e, em verdade, de todas as coisas do cosmo.
Nesta relação o leitor deveria recordar o seguinte extrato de O Universo Misterioso, onde Sir James Jeans escreve:
Isto demonstra que um elétron deve, ao menos em certo sentido, ocupar a totalidade do espaço... Eles (Faraday e Maxwell) descreveram uma partícula eletrificada... que lançava... “linhas de força”, através de todo o espaço (páginas 54-55).
O conceito científico do elétron matemático que ocupa “a totalidade do espaço” corresponderia ao conceito cabalístico de Kether no Mundo de Assiah. Os quatro mundos se explicam no capítulo 7.

Na cabala se inclui aquilo que se conhece com as dez sephiroth. Especula-se a respeito sobre aquilo que estas implicam — Dez números, dez mundos ou dez sons? A dedução geral de Cordovero é que se trata de princípios substantivos de kehlim, vasos de força, ou ideias categóricas mediante as quais se expressa a Consciência do Universo. Uma passagem metafórica do Zohar afirma em relação a este ponto: A água do mar é ilimitada e não tem forma. Porém, quando se estende sobre a terra, produz uma forma... O curso das águas do mar e a força que emite para estender-se sobre o solo são duas coisas. Depois se forma uma imensa bacia com as águas que surgem da fonte; é o mesmo mar e que pode ser contemplado com uma terceira coisa. Esta ampla concavidade d’água se divide em sete canais, que são como muitos tubos largos através dos quais se comunicam as águas. A fonte, a corrente, o mar e os sete canais formam todos juntos o número Dez... Depois a passagem segue explicando que a fonte ou Causa Primária de todas as coisas é Kether, a primeira sephirah; a corrente proveniente dela, a inteligência mercurial primitiva, é Chokmah, a segunda; e o mar em si mesmo é a Grande Mãe, Binah, a terceira; os sete canais citados são as sete sephiroth abaixo ou inferiores, como são denominadas. Os cabalistas postulavam dez sephiroth, pois para eles o dez era um número perfeito, um número que incluía todos os dígitos sem repetição e continha a essência total de todos os números. Isaac Myers escreve que o 0-1 acaba e 1-0, e o rabino Moses Cordovero, em seu Pardis Romonim, diz que “o número dez é um número que abarca tudo. Fora dele não existe outro, pois aquilo que está além de dez volta novamente à unidade”.
Kether, a Coroa, é, pois, a Primeira sephirah. Como Causa Primeira ou Demiurgo se denomina também Macroprosopus, ou o Grande Rosto no Zohar. O número um tem sido definido por Theon de Smyrna como “o elemento principal dos números que, enquanto muitos podem ser diminuídos por subtração e está em si mesmo privado de todos os números, permanece firme e estável.” Os pitagóricos diziam que a Mônada é o princípio de todas as coisas e disseram, de acordo com Photius, os nomes de Deus, a Primeira de todas as coisas, o Criador de todas as coisas. É a fonte das ideias.
A cabala doutrinal atribui a cada sephirah inteligências chamadas de diversas maneiras, Deuses, Dhyan Chohans, Anjos e Espíritos, etc., pois a totalidade do Universo nesta filosofia é guiada e animada por séries completas destas hierarquias de seres sensitivos, cada um com uma missão e função particular, variando em seus graus respectivos e estados de consciência e inteligência. Contudo, há uma consciência indivisível e absoluta, surpreendente em todas as partes de cada partícula e cada ponto infinitesimal no universo manifesto no Espaço. Porém sua primeira diferenciação, por emanação ou reflexo, é puramente espiritual e permite a ascensão a um número de “seres” que podemos chamar deuses; sua consciência é de tal natureza, de tal grau de sublimidade, que superam os nossos entendimentos. Sob certo ponto de vista os “deuses” são as forças da natureza; seus “nomes” são as leis da natureza; são, por conseguinte, eternos, onipresentes e onipotentes — unicamente, contudo, para o ciclo de tempo, embora seja infinito, onde se manifestam ou se projetam.
Os nomes dos deuses são importantes, pois de acordo com a doutrina mágica, saber o nome de uma inteligência supõe possuir, de imediato, um controle peculiar sobre ela. O Prof. W. M. Flinders Petrie, em seu livrinho sobre A Religião do Antigo Egito, afirma que “o conhecimento do nome dá poder a seu conhecedor.”
À Coroa, o primeiro dígito, se atribui o nome-Deus de hyh) (Eheieh), traduzido por “Serei”, significando de forma distintiva que o esquema da natureza não é estática nem um sistema de existência onde os processos criativos tenham sido consumados já faz tempo, senão vibrante, progressivo e sempre favorecedor. Seus deuses egípcios são Ptah, que, uma vez mais, de acordo com prof. Flinders Petrie, era um dos deuses abstratos — e o criador do ovo cósmico; e Amon-Ra — com o qual se identificava a Osíris —, rei dos deuses e “senhor dos tronos do mundo.” Seu equivalente grego é Zeus — identificado com Júpiter na teogonia romana — que se representa geralmente como o pai onipotente e o rei dos deuses e dos homens. Os romanos consideravam Júpiter como o Senhor do Céu, o maior e mais poderoso dos deuses e lhe chamavam de o Melhor e o Supremo. Nos sistemas religiosos da Índia é Brahma o criador, do qual surgiram os sete Prajapati — nossas sete sephiroth inferiores — que, por sua ordem, completaram a criação do mundo.
O diamante é atribuído a Kether, pois é a mais duradoura e reluzente das pedras preciosas. Também, por várias razões, os antigos fizeram do cisne uma atribuição deste dígito. Em todas as lendas o cisne é o símbolo do Espírito e do Êxtase. As lendas hindus contam que o cisne (Hansa), quando lhe davam leite misturado com água, separava os dois, bebendo o leite e deixando a água — supunha-se que isto demonstrava sua destacável sabedoria. O falcão também é uma correspondência. Se recordarmos que Kether é a Mônada, o ponto de vista individual, podemos entender a atribuição do falcão, pois tem o hábito de permanecer sereno no ar, olhando para baixo, desde o éter azul à terra e contemplando tudo com total objetividade.
O âmbar cinza é o mais raro e preciso dos perfumes — embora contenha pouco perfume em si mesmo é o mais admirável como base de compostos, destacando o melhor de qualquer outro perfume com aquilo que possa estar misturado —, tem seu lugar nesta categoria de ideias. A cor atribuída a Kether é o branco; suas atribuições no Tarô são os quatro Ases e no Sepher Yetzirah é chamado de “A Inteligência Admirável ou Oculta”.
De acordo com o Comentário das Dez sephiroth, do rabino Azaziel, cada sephirah tem três qualidades diferentes. Primeiro, tem sua própria função como sephirah já descrita. Seu segundo aspecto é o de receptor para comprovar a sephirah acima, ou a partir de acima, no caso, de Kether; e terceiro, transmite sua própria natureza, e aquilo que são recebidos de cima àquelas sephiroth inferiores (figura 3,                     abaixo).
A Tríade das Supremas




Fonte:

ÁRVORE DA VIDA
(UMA INTRODUÇÃO À CABALA)
ISRAEL REGARDIE

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